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3 min readJul 2, 2024

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existe uma ação na tristeza. digo, existe um movimento aqui, que está aqui e não está mais em nenhum lugar. existe algo que venho descobrindo comigo mesmo quando me permito me sentir triste.

por muito tempo estive revoltado, cheio de ódio, fantasiando cenários de violência, onde com brutalidade eu arrancava a vida de uma outra pessoa que me incomodasse, onde eu quebrasse a garrafa de vidro na cabeça da outra pessoa que me desrespeitou ou até pior.

em minha mente, não havia mais nada além de sangue, eu me sentia satisfeito e tinha a atração nítida nos traços de meu rosto em pensar que eu acabaria com o meu convencido inimigo. eu precisava daquilo e era o que me movia, o ódio.

logo após a passagem brusca dele, arrancando tudo que via pela frente, não restava nada e era pra esse nada que eu encarava. eu estava preso em mim mesmo, fadado a viver das imaginações mais cruéis e não realizar nada, me sentia agoniado, abafado dentro da minha mente, estava muito quente.

como um animal enjaulado que se treme, se debate, grita e agoniza pra tentar fugir. em algum momento, cansaria. quando cansasse, estaria lá, olhando para o nada.

que me encarava de volta com seus olhos pecaminosos mas tão inocentes. apenas a realidade sibilante, com aquele sustenido tão alto e dissonante que só faltava desmaiar em loucura. então, me via no inferno, mas não o de fogo.

era o inferno de gelo, puro sofrimento branco, gélido, inquebrável. aquele que me paralisava e levava minhas palavras a um deserto, que me fazia compor apenas sons de uivos.

me matava pouco a pouco, diferente do ódio que viria com uma força tão grande que me deixaria exausto, esse não, esse inferno ele iria me torturar até não ter mais força para abrir meus olhos ou reagir.

mas logo, passaria.

durante esse tempo, me vi indo de quartos em quartos, entre banheiros e banheiros, espelhos e espelhos, rolando e batendo, me espancando e chorando. me via desesperado, sem conseguir olhar nos meus olhos.

algo mudou e entendi o que é tristeza.

é metálica, é fria. vai estar aqui e sempre vai voltar quando tiver a oportunidade. me visita como se estivesse tímida, mas quando acha espaço fica confortável. passa a mão no meu pescoço, de leve. enfia o dedo no meu olho apenas para ver se ainda lembro dela. me morde e me arranha quando eu paro pra falar com ela.

ela não precisa de um banho de sangue, apenas um pouco a deixa satisfeita, com tanto que continue. mas também não é gananciosa e esfomeada, aceita o tempo que for.

ela não me persegue, ela pede pra entrar e eu a faço se sentir bem vinda.

quando apoio minha cabeça sobre a mesa, quando penso no impensável, quando acendo um cigarro e encaro a fumaça, quando tento chorar mas não consigo, quando eu me pego no escuro olhando para o teto e observando o ruído de minha visão que nunca se acostumou ao escuro.

ela me parabeniza ao ler meus textos, me entrega um sorriso; um sorriso tão fino, dos lábios magros, dos dentes pequenos, da língua cinza. ela não tenta me assustar.

ela sempre esteve aqui.

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