Meus olhos nunca estiveram tão vermelhos quanto agora. Cada vaso ocular tão saltado para fora do limite dos meus cílios, toda minha esclera que se confunde diante esse vermelho sangue ameno. Nunca esteve tão vermelho quanto hoje.
Nem quando do outro prédio, pude enxergar Deus de trás de uma janela fosca, piscando para mim como uma estrela em um céu negro e vasto. Nem quando o próprio todo criador me encarou por meia hora.
Nem quando cada avião imaginário sobrevoou o peito da mãe de Cristo em alguma dessas madrugadas guiadas por almas errantes que enfeitavam o ar com o cheiro de seus corpos já podres.
Nem quando ao pregar meus olhos as seis da matina, pude ouvir o mesmo canto que Pedro ouviu quando negou ao messias três vezes seguida.
Nem quando minha íris flagrou o medo fantasiado de uma garotinha juvenil em um corredor escuro enquanto me paralisava e me devorava com seu sorriso.
Nem quando o ar se tornou estático e congelou a fumaça que saía do cigarro para meus pulmões e retornava para a atmosfera. Nem quando o vento mais frio do inverno uivou pela minha janela.
Nem quando o banho de sangue mórbido encontrou o vinho e a tormenta de um fantasma entre quatro paredes.
Nem quando possuí e dominei um corpo totalmente magro e branco. Nem quando mastiguei os órgãos de meu amor.
Nem quando ouvi o diabo berrar no corpo de um bode marrom.
Ou, quando pela primeira vez, dormi na sala do apartamento 204.