estou bêbado e com soluços. soluços terríveis, malignos e mal intencionados. esqueci de comprar cigarros, mas daqui a pouco devo apagar e dormir.
esse texto será ruim ou provavelmente mediano. não espere muito dele, não espere muito de mim no geral.
estive no trabalho, grandes e demoradas demandas, contato com alguém completamente incompetente. foi o primeiro dia de marcos, no entanto. me estressei, xinguei, bufei, amaldiçoei, fumei, quis beber e estar bêbado o mais rápido possível; o de costume.
não vejo motivo nenhum em citar o que eu faço em meu trabalho aqui, nesse contexto e nesse ambiente. nenhum sentimento que vive dentro de mim está relacionado as funções que eu realizo nos softwares de edição. sendo sincero, eu sinto muita raiva, revolta, indignação, cansaço, desesperança, desaprovação, desgosto, desprezo, ódio. tudo isso vocês podem conferir em outros poemas, desde o início até o final de todos os meus textos.
porém, não poupo palavras. foi estressante, ardiloso, cansativo e frustrante. sinto que quero dar o melhor de mim, sou assim, sou um artista. um artista virtuoso onde até nos passos que dá quando anda, quer realizar o melhor, entregar o máximo de si. imagine então nos vídeos que edito.
sempre que fico enlouquecido com o trabalho penso: “pelo menos não é a concessionária”.
quando saí de lá, na primeira estação, mussurunga, me enfiei em um dos compartimentos do banheiro e virei um pouco de vodka. dois goles. meu estômago ardeu feito de um bebê que acabou de experimentar dendê.
aguentei, foi os dois primeiros apenas. me senti vivo, tranquilo, o estresse passou misteriosamente, tive que respirar fundo para continuar. a esse ponto eu não me considero um alcoólatra por pena.
metrô, leitura ou a tentativa do mesmo livro de antes. estação acesso norte, mudança de linha, linha um agora. depois, estação lapa.
mesma coisa agora, única diferença é que tive que esperar o segurança da CCR metrô autorizar a entrada no banheiro. alguns dos ratos comuns me acompanharam. esperei um pouco, entrei, virei a vodka com dois goles, respirei fundo e lavei minha boca, saí de lá controlando minha respiração. meu estômago ardeu, mas dessa vez como se me desse boas vindas. nesse momento o álcool foi como uma mãe pra mim, me abraçou, me cheirou, falou que me amava e que quando eu tinha nascido podia caber numa caixa de sapatos. me senti feliz, estava anestesiado. quatro goles bem dados era o suficiente.
peguei o ônibus pra universidade, sabia e sei que tenho que estar bêbado para lidar com a presença de outros estudantes ao meu redor. eles são ratos comuns também. anda, comem, dançam, transam, falam, choram, como todos os outros. pior de tudo, dedicam parte do tempo em que não estão fazendo isso que eu citei para ou estudar suas disciplinas perversas ou festejarem o egoísta e cansativo fato de estarem vivo. no fim, estavam mais vivos do que eu. qualquer um estava mais vivo que eu. sou um cadáver que aprendeu a andar, a falar, a se irritar e se estressar. sou um monstro que não deve ser apoiado e endossado. meus textos e meus poemas são ridículos, minha cabeça baixa quando estou bêbado é ridícula, apenas espero o ódio e rejeição de quem presencia tudo isso, no meio disso tudo, algum tipo de atração, compaixão ou aproveitamento. é o que mantém o mundo funcionando.
chegando lá vi uma sequência de fotografias, vídeos e no fim saí para fumar.
o produtor executivo do meu curta abriu a boca, me senti obrigado a falar algo.
falei, mesmo bêbado consegui organizar minhas falas, o professor entendeu e complementou algumas coisas. ele me olha como se fosse único. tem uma barba branca média. um olhar cuidadoso mas que ao mesmo tempo te julga, não se sinta muito confortável.
fui obrigado a fazer um grupo, discussão de papéis, teste de elencos, decidir os dias de gravação. aos poucos fui ficando sóbrio. fizeram uma roda e eu fiquei bem no meio, andando pra lá e pra cá como se fosse super importante. me senti um pouco assim. eles me escutavam, davam ideias, recusei algumas, aceitei outras poucas, ignorei a maioria. eles se submetiam a todo tipo de perversidade minha:
“você gosta de sua mãe? imagine que ela morreu. assim você vai fazer o seu papel”.
duas meninas ficaram horrorizadas. continuei indo pra lá e pra cá, aos poucos estive menos bêbado. provavelmente cheirava a vodka ou o odor do cigarro se sobressaísse, não sei. todos me olhavam como se cheirasse bem. nunca vou abandonar o cinema.
pensei que seria essencial ficar bêbado para essa aula. se ficasse sóbrio aos poucos me sentiria importante e sábio demais para aquilo. bêbado penso que devo ficar sóbrio o mais rápido possível para focar no que estou fazendo, acabo fazendo o melhor de mim por uma falsa necessidade. no fim, acabo ficando sóbrio rapidamente.
enfim, antes disso vi o homenzinho. tem um sorriso bonito, mas um olhar que entrega que nunca iria me declarar o seu inimigo; achei inútil a raiva e nojo que sentia dele. me encarou por alguns segundos, já estava bêbado para determinar quantos foi. depois você mesmo comentou o que ele disse. tinha dito que um maluco ficou encarando ele na entrada. nesse momento você teve certeza que fui eu. tenho um olhar marcante, uma ferradura em brasa no lugar dos globos. consigo marcar a coxa de alguém facilmente. meus olhos são cavernas inexploráveis que dão acesso ao nada.
na volta, vi você, vi ele, vi outras pessoas. você usava uma saia longa florida com cores escuras e avermelhadas, consigo descrever assim, pode ser diferente, admito. as outras pessoas não prestei atenção, apenas tive que abaixar minha cabeça e seguir em frente. estava bêbado o suficiente para não sentir pânico.
vi você, sim. vi você e você sabe disso. parecia mais alta do que o costume, mais pálida que o normal. sua nuca quase não dava para ser flagrada, coberta por seu cabelo que notei também estar maior do que lembrava, mas consegui flagrar.
segui, peguei o ônibus, fui para a orla. observei o mar.
lembrei que nunca estive contigo no mar. maldade, né? você parece gostar do mar. lembro de algumas fotos de suas amigas na praia e daquele dia que estava completamente assado em um morro da praia da ondina.
fiquei mal. senti vontade de vomitar, vontade de fugir. queria o mais rápido sair daquele lugar. pedi um uber moto que chegou em um minuto.
senti uma vontade muito forte de chorar no caminho, desesperadora. apenas senti, tentei ceder, mas não consegui. as luzes se deitavam contra o asfalto, se adaptavam a velocidade que eram obrigadas a passar por meus olhos, pelo meu olhar. meu capacete de vez em quando batia no capacete do motoqueiro, não sentia constrangimento e nem nada. fui afetado por um sentimento terrível enquanto o motoqueiro ultrapassava sinais vermelhos. “as pessoas eram realmente isso” pensei. egoístas, maldosas, impulsivas, mentirosas. todas.
continuei olhando para o chão e pensei como poderia me jogar naquele asfalto e morrer. tiraria outra vida para isso e poderia dar muito errado decidi que não.
cheguei em casa, dez palavras ou menos com jean.
complementei minha embriaguez. complementei minha embriaguez e escrevi esse texto. depois dormi.
acordei no dia seguinte, a ressaca me castigava um pouco. fiquei triste imediatamente, senti que havia perdido algo, que algo teria morrido. levantei, fiquei sentado e olhei para esse texto e decidi alterá-lo.
fumei um cigarro e fiquei pensando no que havia morrido. continuo triste e tentando aceitar que o que morreu, morreu.