coleciono minhas derrotas
em pequenas caixas
onde se acomodam no
passado ou em um futuro
nunca vivido
abro a primeira caixa
olho então: alguns
poemas, uma música
cinco anos
alguns erros empilhados
em outros erros
você vai a praia aqui em
salvador
enquanto eu passo calor
preso em meu quarto
só de pensar que você
e toda sua singularidade
presa nos pequenos dentes
em sua pele rosada
e no sinal ao lado da sua
boca vermelha
passeia por aí nessa cidade
presa no mesmo buraco
de sempre
me sinto assassinado
pela quarta vez no dia
mataria ou morreria
e se possível faria
ambos
para ter os outros quinze minutos
recentes que tive
presenciando toda singularidade
do minha princesa da culpa
abro então a segunda caixa
olho para esse mundo inteiro
de sangue e cinzas
do que um dia já foi
somente fogo
eu vejo inúmeros poemas
uma música
um curta cinematográfico
noites mal dormidas
ressacas seguidas de
mais ressacas
estrelas apagadas e
constelações esquecidas
você passou o ano ao lado de
seu novo homem
logo após de me ligar
perguntando como que
eu consegui estragar
minha vida em
dois mil e vinte três
te respondi com uma palavra
muito simples:
cocaína
mas ainda sim, tive a pouca
decência de te recomendar
não fazer isso
no dia seguinte, você e sua
tendência escorpiana de
sempre esfaquear
independente da
intenção, se prova
e com todas essas cinzas
de cartas antigas queimadas
admiro uma última vez
minha caixinha da derrota
abro então a última
vejo uma paixão de verão
permeada por dúvida e
talvez arrependimento
não se dialoga com a culpa
no entanto, é possível
se perder nas memorias
te escrevi crônicas
cartas
te compus uma
música
quando foi embora
e meses depois
não falhei com a
minha tendência
escorpiana
o tempo foi injusto conosco
o espaço foi cruel
mas nada seria diferente
pois meu andar químico e
inseguro
tomou o papel de
dar o rumo
restando assim uma última
opção
viver o ridículo
o absurdo
preso nos tecidos
de meus lençóis
enquanto o suor queima
minha pele
enquanto lágrimas ameaçam
escorrer em
minha pele
enquanto meu sangue
refaz o mesmo caminho
em toda minha
pele
me volto aos poemas
me volto aos minutos
presos nos instantes
que nunca voltarão
ao estado presente
e assumo as derrotas
colecionando-as
em caixas.