você me ensinou a
não matar formigas e
aranhas
a cada estralar da tampa
do esgoto que está ora
meia solta e meia
encaixada
por conta dos carros
que passam por cima
dela
eu lembro disso:
você me ensinou a
não matar formigas
e aranhas
coleciono recortes das
luzes que enfeitam a
cidade
palmeiras
prédios
janelas
postes
letreiros
outdoors
holofotes
faróis
em época de natal
elas ficam mais fortes
e os piscas-piscas fazem
companhia a elas
representando assim
a felicidade inteira de
uma só nação
você me ensinou a
não matar formigas e
aranhas
e junto disso seu rosto se
esconde no fazer dessas luzes
sendo assim uma lenda urbana
própria
uma crônica a qual nunca houve
final escrito por mim
apenas por você
um ditado que só é repetido
por uma só língua
talvez seja por isso que
eu escreva sempre sobre
as luzes
a dúvida de seus olhos ameaçam
se revelar por detrás de todas elas
apenas, a incerteza de seu olhar
a possibilidade, a chance
e junto com ela, as luzes
mais uma vez
a tampa ora meia
aberta, ora meia
fechada
estrala com o
passar dos carros
e eu lembro uma
última vez que
você me ensinou a não
matar formigas e aranhas
eu olho ao lado e vejo o corpo
enrugado da formiga que matei
sendo carregado por outra
enquanto uma luz inofensiva
ilumina a cena.