eu não pertenço aos céus
minhas asas foram negadas, no lugar me entregaram mais duas patas
para que eu pudesse me rastejar aos cantos, sempre numa espécie desafinada de prantos
essas lágrimas mancharam o chão, com um vermelho-sangue tão forte, mas também em vão
eu não pertenço aos céus
formei retratos com essa tinta, pintei quadros com essa ira
escrevi versículos com esse escarlate, acreditando estar em catarse
pensei um dia que voaria, decidi então que gostaria
de conhecer o azul de cima, tentar admirar uma única e nova vista
tentei me salvar com essas palavras, com essas frases rimadas
com esses elogios sinceros, com esses sorrisos elétricos
com essas declarações tão agudas, que nasceram de uma face tão úmida
com essas histórias tão bonitas, narradas por uma paixão incisiva
com um toque tão jovial, que vieram de mãos delicadas e um sorriso angelical
me enganei ao tomar posse dessa alma que não era minha, não me pertencia
eu não pertenço aos céus
mas você sim
voe e volte com um capim em seu bico, todo corvo precisa de um ninho
meus dedos assinam meus poemas e textos com sangue
minhas lágrimas são puro sangue
meu amor é somente sangue
minha paixão é banhada por sangue
a saudade corre em meu sangue
a aceitação não estanca esse sangue
e eu temo que você esqueça o gosto de meu sangue
mas mesmo assim, voe, pássaro errante
você vai conquistar o mundo